Aquele ser era meio homem, meio bicho; meio animal, meio humano; um pouco selva, um pouco civilização.
De tanto ver tantas pessoas sendo assim, ele também começou a ser: na verdade, ninguém sabia de onde surgira aquele ser totalmente indefinível, pois um dia ele simplesmente passou a existir nesse lugar. Não se sabe em que continente, em que épocas históricas ele viveu. Não sabemos a sua idade, a sua história, o seu tempo.
Ele não possuía passado, não era consciente do seu presente e não tinha preocupações com o futuro, pois o tempo lhe era um estranho. Era um ser atemporal, assexuado, não - socialmente localizado: as maneiras de viver aqui não eram óbvias. Além disso, não possuía um parâmetro comparativo, pois tudo que vivera anteriormente (se teve vida antes) fora esquecido. Sim, ele não possuía memória. Nunca, conforme seus modos indicavam, vivera com seres semelhantes ou não-semelhantes. Ele era a novidade pura, o sem-nome, o sem-vida, o sem-nada: apenas corpo. O tempo nunca agira sobre ele.
O novo sem-nome é inserido nesse modo de vida a partir do próprio modo de vida que o insere: nesse processo, ocorre um julgamento de tudo que falta ao novo para se adequar ao todo-igual hegemônico. Por aqui se vive de um jeito!
E assim o meio bicho foi se humanizando: o que significa que o bicho aprendeu a se comportar como tal. Ele quase não era mais corpo. Sentiu fome, frio, sede, desejos; teve curiosidade; era um estranho total.
Mas se humanizou à nossa maneira.
Deise
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